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segunda-feira, maio 07, 2007

Seria engraçado... se não fosse trágico!

" -Temos um probleminha: a porta está quebrada.
-Ok,ok. Vamos dar um jeitinho na janela e arrumamos também o teto"
No Brasil é assim. Os problemas existem e as soluções encontradas não servem para solucionar esses problemas. Agora a mais nova discussão do país é sobre o aborto. Possivelmente teremos até um plebiscito! Então, a sociedade brasileira(justa e consciente) vai dizer sim ou não ao Carlinhos, filho da Joana que mora na favela da linda cidade do Rio de Janeiro. Muito bem, os ânimos se alteram na discussão entre o lado que apóia o aborto e o lado que está a "favor da vida". Uns dizem que Joana tem o direito de vetar o Carlinhos porque ela não terá condições de oferercer-lhe uma vida digna. Outros, dizem que o Carlinhos deve vir ao mundo, porque é uma vida e tem direito de nascer, independente de quaisquer conseqüências.
A sociedade brasileira está jogando a sujeira para debaixo do tapete. O Brasil foi construído fechando os olhos para os problemas. Antes de discutir a legalização ou não do aborto é preciso resolver uma série de deficiências no nosso país. O que leva Joana a querer abortar? Aliás, por que Joana está grávida aos treze anos de idade? Por que ela mora numa favela que fica ao lado do bairro mais nobre do Rio de Janeiro? Por que seus amigos estão usando drogas? Por que sua mãe está sendo espancada pelo seu pai? Por que seu pai está desempregado? Por que sua escola não tem aulas?
Antes do Brasil discutir o aborto, precisa ter um Estado que cumpra com seu papel, que assegure para Joana uma educação de qualidade, uma habitação, o direito à cidadania, o direito a uma vida digna. Quando o governo por em prática os direitos dos cidadãos que estão assegurados pela constituição brasileira, teremos o início da verdadeira solução dos problemas. A base do Brasil está corroída pela corrupção, injustiça, falta de compromisso social e falta de um Estado comprometido com o bem estar da maioria da população. Fazer alguns retoques no ápice da pirâmide é tentar mascarar a realidade; o povo continuará com as marcas da desigualdade e do desamparo de um Estado descompromissado e de uma sociedade apática.
É muita hipocrisia da sociedade levantar a voz e colocar-se a favor ou contra o aborto. Os que se colocam a favor do aborto dizem que a mãe tem direito a abortar, se achar que não tem condições financeiras de assegurar uma vida de qualidade para o filho. E eu me pergunto: por que esse grupo não levanta a voz para questionar o fato da mãe não ter condições de criar seu filho? Por que não se pergunta sobre as conseqüências dos abismos sociais? Existe, também, o grupo que diz NÃO ao aborto, o grupo do "sim à vida". E eu novamente me pergunto: será que esse grupo não está vendo as muitas vidas que estão nas ruas, nas filas dos hospitais, nas palafitas, nas infinitas filas por emprego? Por que esse grupo não levanta a voz e diz SIM para essas vidas?
Fazer um plebiscito sobre o aborto e colocar o tema no centro das atenções da sociedade é uma maneira de acreditar que se está discutindo os problemas sociasis do país. Deveríamos ter um plebiscito sobre a impunidade dos políticos corruptos ou sobre a qualidade da educação básica e superior ou sobre o turismo sexual que assola o país. Mas não há uma vontade coletiva para promover melhorias no Brasil; e enquanto a sociedade continuar amorfa e apática, nenhuma mudança será efetivada. Continuaremos consertando janelas e deixando as portas quebradas.
Espero que resistamos...

4 comentários:

Unknown disse...

Adorei o texto, achei politicamente engajado e correto. Mas é interessante verificar que não somos somente nós- brasileiros - que estamos meio tontos com o assunto. A Suíça, por exemplo - país que detém alto nível de qualidade de vida- submeteu sua população a um referendo no qual escolheria pela liberalização do aborto ou endurecimento da lei vigente (cinco anos de cadeia mais multa para a mãe que pratique o aborto). A população maciçamente escolheu pela liberalização - 72% -. Imagine que num país como a Suíça, uma em cada oito gestações acaba em aborto.

Anônimo disse...

Ainda na linha posta por Anderson, no comentário anterior, indago o fato de que tal discussão sobre a legalização do aborto ou ñ, advem não de análise social da vida de Joana, mas sim da inaplicabilidade ou falta de uso no caso concreto dos art. 140 e 141 do nosso código penal, tendo em vista (agora sim)a realidade social brasileira, onde o próprio delegado de policia e até mesmo a sociedade considera sua apuração e punição menos importante e até mesmo injusta ante todos os fatos já narrados sobre a vida das Joanas pelo Brasil.

Assim tal discussão funda-se na admissibilidade tácita pela sociedade de conduta antes criminalizada e veementemente repudiada. Ademais, sendo o direito uma ciência dinâmica, deve ela adequar-se ao sentimento social, a idéia de "justo" ou aceitável, para que possa refletir a sociedade que disciplina e ordena. Essas são as minhas humildes considerações sobre o assunto.

Éverton Vidal Azevedo disse...

Érika concordo plenamente com seu texto. Acho que é por aí mesmo...

Abro um parêntesis para dizer que apreciei a visita do Papa ao Brasil... Todavia achei que ele deu demasiada ênfase à questao do Aborto e INfelizmente deixou de lado temas muito mais urgentes para serem frisados no Brasil.

É sempre assim. Nos preocupamos com a superfície e nao enxergamos que o problema é na base, é sempre na "infra" e nao na "super".

Antes pensarmos no que fazer com os abortos-mortos (pois é isso o que o plesbicito é) devemos abrir os olhos para os abortos-vivos que estamos debaixo dos nossos olhos nas praças e ruas.

Bj Erika.
Posso postar seu texto num outro lugar (citando devidamente a fonte)?

Inté!

Gustavo disse...

Aqui no Brasil tá tudo por um porque de jeitinho em jeitnho construímos uma Arapuca, e uma hora vai desabar.
E quer saber? eu to torcendo pra essa hora chegar...

A solução é derrubar o barraco e começar do zero!