Pages

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Indignação por tempo limitado??

De vez em quando a gente se pega pensando nos problemas dos outros...
É natural - diria até "inevitável" - que os sentimentos humanos, tão habituados a passear pela oscilante curva da incerteza, fiquem mais acesos quando as circunstâncias pedem "um minuto de silêncio".
Acho que isso aconteceu com algumas pessoas na semana passada. A terrível falta de humanidade demonstrada pelos assaltantes que mataram uma criança de 6 anos, no Rio de Janeiro, plantou no olhar de muitos um espanto que misturava medo, indignação e revolta. Foi como se retirassem debaixo de nossos pés o solo sob o qual nos apoiamos... Algo inacreditável.
Como não poderia deixar de ser, parece que nessas horas todas as vozes ecoam o mesmo coro. Nas ruas, na escola, no trabalho, nas capas de jornais e revistas, vemos, ouvimos e lemos a mesma coisa. De repente, um turbilhão de comentários, pseudo-protestos, "reportagens especiais", discursos indignados... Tudo conforme o figurino! Nos sentimos como quem "inaugura" uma Revolução! Seria assim, se toda essa indignação não fosse tão breve...
Vemos que os fatos vêm e vão, as barbáries acontecem diariamente, a cada minuto homens, mulheres e crianças morrem - sejam assassinados, nas filas de hospitais, em acidentes evitáveis ou por tantos outros motivos banais. Mas quem se importa com isso de verdade? Se até hoje, em pleno século XXI, ainda se morre de fome, o que mais falta acontecer? Morrerem mais de 4 milhões de pessoas numa guerra Civil por recursos naturais? Ou termos 1 milhão de pessoas desabrigadas por enchentes em algum lugar do mundo? De certo essas não seriam hipóteses adequadas, até mesmo porque, é lamentável constatar que há muito tempo esses horrores já deixaram de ser hipóteses. Por mais descabido que possa parecer, a guerra civil entre Congo e Burundi já vitimou este "discreto número" de SERES HUMANOS!! Mas alguém aí sabia disso? Temo que a maioria desconheça esses dados; mas estejam certos de que isso não é produto da minha imaginação. Estes são "apenas” fatos assombrosos que, como muitos outros, não recebem a atenção devida desse modelo de imprensa "hollywodiana" que se fez formadora de opinião da maioria esmagadora da população.
Talvez alguns mais atentos já tenham percebido como nossos meios de comunicação se voltam massivamente para aquelas 'notícias-espetáculo". Quando alguma coisa chocante acontece, eles se embrenham numa busca desenfreada por informações, batem e rebatem aquele tema que se propuseram a abordar, concentram toda uma população espectadora em volta do mesmo problema, até que esgotam todos os seus recursos e, como quem fecha um sepulcro, enterra aquele assunto - de tão batido - e só então resolvem tratar de todas aquelas outras coisas que cederam espaço para aquele tema de "grande relevância social"!! É por essas e outras que não existe "tempo" para tratar dos desabrigados da África, dos grupos nazistas que silenciosamente se desenvolvem no interior dos EUA, muito menos das mulheres negras que são diariamente espancadas no recôndito dos lares da brasileiros...
Talvez tratar exaustivamente sobre a voluptuosa “crise dos aeroportos” durante 4 semanas ininterruptas seja mesmo “vital”, afinal, o fato de 94% da população nunca ter sequer pisado em um aeroporto não deve fazer assim tanta diferença, não é mesmo? Provavelmente os milhares de “Marias” e “Josés” que diariamente são esmagados nos ônibus que lhes conduzem para o “serviço”, e que por vezes têm que “escalar” os morros que dão acesso as suas casas, não se importem tanto com isso... Mas quem se importa com eles?
De fato, é bem fácil nos fecharmos em nosso mundinho cor-de-rosa e só olharmos para estes pobres excluídos quando de alguma forma eles mancharem a nossa “perfeita realidade”. Mas até quando podemos esperar destes homens e mulheres tradicionalmente massacrados pelo sistema, uma “fidelidade canina” àquilo que lhes impomos? Teriam mesmo algo a perder se optassem por trilhar o caminho do crime para libertar-se da miséria e da opressão à qual foram submetidos durante séculos? Sinceramente... Não acredito.
Mas então o problema está em nossas leis?
Receio que não. Mesmo reconhecidas as suas limitações, não é só mexendo nas leis brasileiras que resolveremos o problema. Ou alguém aí acredita que aquele “garotinho de 16 anos”, que participou do crime supracitado, deixaria de fazê-lo caso fosse penalmente responsável?? Os outros maiores de idade não deixaram, por que então, logo ele esitaria? Não me parece razoável tal conclusão.
Tudo bem; entendo que para descarregar nossa consciência nós tentemos eventualmente aplicar antídotos aos problemas sociais; mas até quando? Vamos esperar que este “Grito dos Excluídos” ecoe ainda mais alto? É claro que não existe fórmula mágica para resolvermos problemas sociais, mas combatendo esta brutal exclusão nós evitamos que crimes banais se repitam. Falo de pequenas ações, coisas simples que podem fazer a diferença. Até entendo que o amor ao próximo há muito tempo já deixou de ser um sentimento cultivado pela maioria dos homens, mas demonstrar atenção e respeito já é um bom começo. Olharmos nos olhos e cumprimentarmos pessoas rotineiramente postas à margem da sociedade é uma tomada de atitude para que diminuamos esse abismo que se coloca entre os homens e que tem transformado seres iguais em “diferentes” e alimentado essa exclusão social que entre nós já é brutal.
E só pra lembrar: elevador de serviço não é aterro sanitário, é apenas um elevador que fica ao lado do social... Algum problema em subir por ele??????
É isso. Espero que venham as pequenas ações... E que lhes sucedam as grandes transformações! Ah! E tomara que o desfile das Escolas de Samba não transforme nossos noticiários na casa da “Penélope Charmosa”... pelo menos desta vez...

3 comentários:

Anônimo disse...

concordo com quase tudo o que vc disse, só discordo no seguinte: leis mais duras poderiam ao menos garantir que eles não voltassem a cometer brutalidades como esta. bjos!

Ianna Gabi disse...

Ow amiga...
Texto esplêndido esse!Amei...
Quero dizer que é muito triste a gente parar pra observar o mundo e ver o quão monstruoso ele vem se tornando...Tudo por causa de quem?!De nós mesmos, seres egoístas e mesquinhos que somos!Se um político nos dá dinheiro pra votar nele, os burros aqui votam.Se uma criança pára a gente na sinaleira, o que fazemos?!Fechamos o vidro na cara dela.Será que a gente dá um bom dia, ou pergunta como vai uma doméstica ou um porteiro?!
Um dia recebi um e-mail falando de uma nova modalidade de sequestro.Os ladrões criam uma situação chamativa, usando uma criança chorando, p atrair quem passar perto.Quando a pessoa vai ver, já foi raptada, os ladrões exigem uma certa quantia e no fim, quando pensa-se que acabou tudo bem, a vítima descobre um buraco no próprio corpo, com um bilhete escrito bem assim: "se nós não podemos viver como gente, se nós somos desprezados pela sociedade, vc também será.Porque eu sou de carne de osso, como vc.Se eu não posso viver, você tambem não poderá".E a pessoa descobre q foi contaminada com as mais terríveis doenças: hepatites, AIDS, outras DST's...
Tá tudo errado gente... (a continuar)

Anônimo disse...

vc é mesmo muito parecida comigo, apenas faço uma ressalva q vc não deve ter atentado, a sociedade não está aflita para acabar com a criminalidade através da diminuição da idade penal, o q os homens querem de verdade é uma possibilidade para descarregar o seu ódio praticar seu desejo de vingança, a revolta é pela pequena punição q vai ser dada ao menor, a ressocialização não importa. O sentimento é de vingança, achando que estaão mais protegidos se os jovens pobres estiverem todos eles nas cadeias e os velhos nos asilos e de preferência se eles forem negros. É a nossa sociedade cada dia mais segregada. O seu texto foi brilhante e eu sou seu fã! Beijos, Diego!!!